O Open Finance abre as portas para uma nova era de inclusão financeira, em que o acesso sem precedentes aos dados está revolucionando os processos de tomada de decisão de crédito. No entanto, para concretizar a promessa de novos e mais modelos de crédito por meio da IA, há uma necessidade fundamental de responsabilidade ética.
Uri Tintoré, co-CEO e co-fundador da Belvo
Recentemente, tive a oportunidade de me juntar a Scott Zoldi, Chief Analytics Officer de nossa parceira FICO no World AI Cannes Festival, para falar sobre o papel da inteligência artificial ética no aproveitamento de dados financeiros abertos para impulsionar o acesso ao crédito de forma responsável.
Saí da conversa com a sensação de estar presenciando um momento decisivo no nosso setor, onde a construção da inclusão financeira através da tecnologia deixa de ser um sonho e passa a ser uma realidade. Algo que ressoa profundamente com nossa missão na Belvo: democratizar o acesso a serviços financeiros em toda a América Latina. Ao testemunhar em primeira mão como essa missão se cruza com o poder do Open Finance e dos princípios éticos da IA, fiquei compelido a compartilhar alguns insights.
O Open Finance traz oportunidades únicas de construir modelos de crédito extremamente poderosos. Com ele, é possível ver e entender como as pessoas gastam seu dinheiro com um nível de detalhe nunca visto antes. Ao examinar os dados transacionais, é possível ver como os usuários gastam em coisas como viagens, alimentação, dívida, e muito mais, fornecendo uma imagem vívida de como gerenciam suas finanças.
Potencialmente, isto também abre caminho para maneiras inéditas de tomada de decisão de crédito. Mas, ao explorar essas novas possibilidades, também enfrentamos grandes desafios. Primeiramente, para construir modelos robustos e confiáveis, precisamos de dados de altíssima qualidade. Em segundo lugar, como podemos garantir que os modelos que criamos tomem decisões que possamos explicar e que sigam princípios éticos?
Vamos explorar esses dois grandes tópicos: como criar modelos de crédito robustos e também garantir que sejam éticos e explicáveis.
O desafio da qualidade dos dados
A criação de modelos de crédito robustos a partir do Open Finance requer uma abordagem abrangente para o gerenciamento e a análise de dados. Temos que lidar com a complexidade e a qualidade dos dados recebidos, que podem estar incompletos ou imprecisos, e achar soluções.
Depois, vem a estruturação, a normalização e a categorização dos dados. Na Belvo, conseguimos passar de 37 pontos de extremidade disponíveis para classificar os dados em quatro grupos principais: proprietários, contas, faturas de cartão de crédito e transações.
Em terceiro lugar, precisamos criar métricas relevantes que possam ser usadas para criar os modelos, pois lidar com as informações brutas é muito complexo. Depois que todas essas etapas forem concluídas, podemos começar a criar modelos e treiná-los.
Uma parceria poderosa para a inclusão financeira
E é aí que a tecnologia da FICO entra. A FICO oferece um conhecimento técnico inigualável quando se trata de desenvolver recursos e modelos avançados para avaliação de crédito. Por exemplo, eles permitem a detecção de indicadores que categorizam os usuários com base em diversos critérios, facilitando a identificação de padrões como pagamentos atrasados em cartões de crédito. Esses padrões são fundamentais para a criação de modelos de crédito precisos.
Além disso, a FICO compartilha nosso compromisso com a igualdade nos serviços financeiros. Embora a inclusão financeira seja frequentemente mencionada como uma meta, para nós e para a FICO, trata-se de um compromisso profundamente arraigado. Ao colaborar com eles, temos a oportunidade de desenvolver modelos que priorizam a justiça, a transparência e a responsabilidade.
Isso significa não apenas criar modelos éticos e responsáveis, mas também garantir que eles sejam explicáveis e auditáveis. Em essência, ao combinar nosso potencial de atingir populações desatendidas na América Latina com os dados do Open Finance, estruturados e de alta qualidade, da Belvo e os princípios de IA responsável incorporados em sua tecnologia, podemos alcançar a verdadeira inclusão financeira.
IA ética, explicável e auditável
Mas o que significa criar modelos que sejam éticos e responsáveis? Vamos detalhar isso.
Garantir que nossos modelos sejam éticos e responsáveis é uma das principais prioridades da FICO e da Belvo. E isto não é tarefa fácil, especialmente se considerarmos que muitos modelos de machine learning funcionam como “caixas-pretas”, dificultando o entendimento do processo de tomada de decisão.
Para enfrentar esse desafio, nós podemos restringir ativamente os processos de aprendizagem dos nossos modelos, evitando assim a introdução de resultados tendenciosos. Um modelo mais preciso que inclua vieses “não inclusivos” não é aceitável. Para isso, é preciso analisar o modelo e incluir restrições, como determinadas combinações de variáveis.
Explicabilidade é um outro fator chave da IA ética. Os seres humanos devem ser capazes de entender e explicar por que uma determinada decisão foi tomada por uma máquina, especialmente quando se trata de algo tão significativo quanto a aprovação de um empréstimo. Trabalhar com redes neurais interpretáveis é uma saída, uma vez que permite manter a transparência nos modelos, possibilitando que os seres humanos possam compreender suas decisões.
E mesmo depois de seguir todos estes princípios, como podemos comprovar que estamos tomando as medidas certas e que os nossos modelos realmente são éticos e explicáveis? Através de tecnologia blockchain, a FICO consegue rastrear cada etapa do processo de desenvolvimento do modelo. Isso garante que todas as alterações ou adições ao modelo sejam registradas permanentemente e não possam ser alteradas. Como resultado, temos um processo de desenvolvimento de modelos totalmente auditável.
Criando um impacto real
A criação de modelos éticos e responsáveis exige um esforço maior do que a criação de modelos mais simples. Mas os resultados positivos que já estamos vendo servem como fonte de motivação, pois nos lembram da importância de nossa missão de democratizar o acesso a serviços financeiros para todas as pessoas.
Um exemplo interessante do impacto destes esforços é o de um caso recente envolvendo uma empresa de crédito brasileira. Usando modelos baseados em Open Finance em sua estratégia, eles conseguiram um aumento de seis vezes nas aprovações de empréstimos e reduziram o risco de perda em três vezes.
Esse é apenas um exemplo do potencial transformador que temos pela frente para impulsionar a inclusão financeira real na região. Ao capacitar indivíduos e comunidades com acesso a serviços financeiros justos e transparentes, não estamos apenas remodelando o cenário do crédito, mas também contribuindo para uma sociedade mais equitativa e próspera.